





CONTRUÇÃO DE REALIDADES
O retrato é a representação de uma pessoa. Pode ser a busca de sua alma, de sua essência, mas sempre é uma representação. A natureza, Deus ou o que você preferir acreditar criou ou desenhou o mundo, com suas estrelas, luzes e sombras, linhas e curvas. A fotografia deu este pincel a natureza. E o olhar, sensibilidade e experiência do fotógrafo organiza e dá valor a imagens e momentos.
O mundo, a natureza e as construções são cenários e possibilidades de composição infinitos. Ao chegar a uma locação, é possível criar
diversas histórias, perspectivas e planos, molduras e pontos focais de diferentes potências e gostos. Cada um pode ver de uma forma, dependendo de suas influências. Claro que influências e modas podem se cruzar.
Existe também a possibilidade de criar realidades. Montar cenários dá um poder criativo muito grande à fotografia, ao retrato e ao ensaio de moda. Em um pequeno espaço pode-se criar o mundo.





















































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sandro viana










Auto-retratos
Fumaça
Caminho por uma rua de terra em um lindo vale de rochas avermelhadas no centro da África do Sul. Meu objetivo é chegar no vale das Sangomas. Um amigo indicou a direção, virar à esquerda no campinho de futebol e começar a subir a montanha.
Me perdi na trilha inexistente e descobri um cantinho para dormir ao lado de uma moita. Havia levado meu velho saco de dormir, com o zíper quebrado, caso eu decidisse ficar por lá. O frio foi intenso naquela noite.
Uma amiga conhecia a Sangoma principal daquela comunidade e me deu três grandes velas para presentea-la. Eles tem a cultura de sempre manter uma vela acesa. Fogo é transformação em uma forma bem clara e tangível.
Como a manhã teimava em não chegar, e o sono era prejudicado pelo frio, decidi acender uma das velas para me fazer companhia e esquentar as mãos.
Já percebeu como é possível olhar para esta chama sem machucar os olhos? A fumaça quase que inconscientemente cobria as estrelas por um momento. E conversava assim com as transformações do movimento, dentro e fora.
Palhaço
Em tempo de quarentena, colcha pendurada no varal é meu palco, e não há platéia e parceira melhor que minha mulher e filha.
O palhaço, ou talvez o clown, é isso, este desligamento de si mesmo, quando se entra de corpo e alma num personagem. É um grande exercício de libertação.
O clown flutua entre todos os sentimentos, do muito alegre, ao extremamente triste. Seu símbolo é usado em festas infantis e em filmes de terror. Ele é o acrobata que parece desajeitado. Criativos em muitas cores. Usado e desrespeitado na realeza antiga. Amado em grandes grupos circenses e canais do YouTube. Virou o anti-herói, impregnado de raiva e de risada travada na alma. Ele é o grande diretor e ator do cinema mudo, vagabundo e marginal. Ele é o Arlequim, Pierrot, Augusto. É também o bufão, o saltimbanco.
Para mim um ser que consegue deixar o ego de lado e ser ele mesmo de forma intensa e despretensiosa. É alguém que consegue visitar outras dimensões da existência humana. Um exercício de abnegação.
Eles fazem todos rirem de um tropeço. E se levanta para continuar o show.
Fogo
No último suspiro do fogo, quando o combustível está perto a se extinguir, não há oxigênio que o faça sobreviver. E então fica frio e escuro.
Como escoteiro acampei muitas vezes e, dos 10 aos 15 anos, só cozinhávamos com fogueira. Contruímos um tripé de bambu, onde pendurávamos o caldeirão. Como bruxos e alquimistas misturávamos a receita entre fagulhas e fumaça. Não é fácil procurar lenha no escuro. À noite caminhávamos, sem lanterna, treinando o tato para encontrar lenha seca, que nos ajudaria a ter nossa refeição pronta. A noite ganha um respeito especial. Mas perde-se o medo paralisante.
O fogo é vida explodindo a milhões de quilômetros da terra, mas também pode matar. Ganhou este sentido de energia, vivacidade, mas também raiva. A raiva chega e pode tomar conta. Poderoso, faz-nos acreditar que sempre há uma causa externa para ele. E a única forma de conte-lo é perceber que este fogo surgiu internamento, de uma combustão espontânea. Claro, sempre há gatilhos para as sombras. E com certeza você tem razão em suas explicações e conjunturas. Mas o como lidamos com o externo é a diferença entre ser feliz ou não, entre o fogo da vida e da morte.
Mosaico
Assistindo um documentário sobre inteligência artificial questiono nossa condição humana. Do que somos feitos, o que somos além de seres biológicos e mecânicos, de onde viemos, por quê estamos aqui. Nada mais filosófico. Esquartejo meu corpo, procuro me enxergar em pedaços, e entender meu papel no mundo.
Crio um mosaico e organizo as partes, busco equilíbrio, alguma simetria talvez, escondida em linhas complexas. Caminho a atenção interior por todo o contorno do meu corpo, e procuro sentir meu tato, minha pele, meus neurônios trabalhando. Acompanho cada curva e tenho então uma grande consciência presente. Medito nos sentidos e no presente. E em nenhum momento como este, a vida faz sentido, com dor, solidão, grandiosidade e plenitude.
Juntos
O aniversário vai se aproximando e penso na casa cheia. Bagunças criativas já aconteceram por aqui. E sempre encontro esta oportunidade para reunir amigos muito queridos, que nem sempre consigo encontrar.
Mas se pensarmos no aniversário como mais um ciclo em torno do sol e que comemoramos nossa estada na Terra, há tantas formas de festejar. Tão importante meditar e agradecer a tudo aquilo que temos, há tudo aquilo que alcançamos, por todos os aprendizados, mesmo àqueles que deixam cicatrizes.
Percebo então minhas muitas personalidades. Sou todos e sou um. E revezo os instrumentos que a vida me proporciona e tento fazer música, criar belezas e alegrias.
Tenho sorte de caminhar neste momento ao lado das minhas amadas mulher e filha. E aprendo sobre mim mesmo em todos os dias de convívio, em cada abraço, em cada palavra. E gratifico pela oportunidade de buscar ser uma pessoa melhor.
As notas nem sempre saem do jeito que queremos. Mas tocamos…
Folhas
Folhas secas, num último suspiro antes de cairem. Murcho, mas com uma beleza dourada, alaranjada, com tons de amarelo, voam, livre. A queda como a de um paraquedista. Da função de respirar luz, elas perdem o verde e flutuam com a cama de vento e viram terra.
A goiabeira lá de casa tem um teto e um chão de folhas – respirando luz e produzindo energia para raizes profundas. Minhas raízes parecem crescer, alcançando energia do solo, conversando com minhocas e outras raízes. Ontem encontrei uma raiz, e mesmo não conhecendo suas folhas verdes, ou suas flores, frutos talvez, foi uma troca bacana… profunda…rs.
Como árvore, e como raiz, pensei que poderia conhecer mais sobre o solo, saber mais sobre sua composição. Em qual livro explica como meus braços de madeira absorvem energia deste composto marrom escuro, às vezes quase preto. Mas sinto o toque, sinto os nutrientes me fazerem crescer. E cresço. Busco o céu, me estico para achar a luz. E quem sabe encontrar a árvore da qual as raizes me apaixonei.
Janela
Pela janela tento te alcançar, mas não posso. Por mais que tente… parece que estou num sonho. E a cada passo para a frente parece que deslizo para trás. O fogão a lenha está aceso e o ambiente assim fica com temperatura suportável. Fora está nevando e vejo a cerca de madeira e uma pequena araucária. Nada mais peculiar neste região do Chile.
Quero sair mas não quero enfrentar -10 graus.
Quantas memórias e visões pelas janelas. Quando estava de castigo no beliche do meu quarto, olhando do segundo andar meus amigos brincando de queimada. Tão próximos e tão distantes. Ainda posso escutar os sons, lembrar das sensações.
Também havia a janela estreita da casa da minha mãe, sobre a porta de vidro. Muitas vezes pulei por aquela fresta quando esquecia a chave.
Pela janela analisamos pela primeira vez como está o tempo, nos preparando para ir para o mundo. E agora observo. Observo e espero, pois tudo lá fora parece inalcançável como num sonho.
Lona
Será que se conseguíssemos ver todos os sinais de ondas, estaríamos mais conectados do que nunca. Talvez o mundo esteja funcionando com um cérebro, com sinais entre seus bilhões de neurônios. E brincamos com esse entrelaçar, distante, mas que potencializa incontáveis possibilidades de conexão.
Meditamos sobre os traçados que nós, neurônios deste grande cérebro, deixamos pelo caminho – quando ainda migrávamos. E assim percebemos quais pegadas ainda estão aparentes, e quais o mar apagou.
Continuamos para o futuro acompanhando com as mãos uma linha, com os olhos vendados. Confiamos no tato. Confiamos em quem preparou esta linha. E agradecemos a cada objeto que cruza nosso sendeiro.
Preste atenção, pois o próximo objeto pode estar bem próximo.
Repetições
Somos todos programados a repetições. Nos acostumamos ao certo, àquilo que não trás grandes riscos. E nossa vida passa como um grande estroboscópio, em ritmo difuso, torto, num emaranhado de cenas soltas, que com um pouco de esforço, vira uma história.
E então para todos chega a hora de viver a jornada do herói, contada por Joseph Campbell. Temos que enfrentar nossos medos, e ultrapassar as tentações. É preciso dar um passo firme rumo a quebra das repetições e na aventura de chegar ao seu valor, ao seu dharma, ao seu labor, ao seu tesouro, o seu Deus interior, seu Eu maior, àquilo que você pretende deixar para o mundo.
É um passo no escuro, um salto ao desconhecido, um gesto de confiança e fé.
A jornada terá seu fim. Mas as transformações são eternas.
Noite
O que é normal? A história se conhece: a pessoa acha que todos são loucos, todos a sua volta. No fim, percebe que o louco era ela mesma.
Lembro no primeiro ano da faculdade alguém me chamou de uísque – o esquisito. Ninguém gosta de se sentir não pertencente, mas hoje tenho uma certa alegria de não ser tão comum. Ah, e tudo se transforma, pois estas mesmas pessoas do ano inicial da minha formação de jornalismo tornaram-se grandes amigos, até hoje presentes em minha vida, cada um com suas loucuras e esquisitices.
As sombras afinal estão presentes na vida de todos. E as sombras podem tomar vida própria se não temos consciência e conversamos com elas. O pior cego é aquele que acha que enxerga.
MUSICA
A musica tem algo de incrivelmente belo e admirável. Uma das linguagens mais lindas. A música tem muitos amigos, mas um de seus grandes é o tempo. O tempo, o beat, o rítmo, a batida, o pulsar, o batimento.
O tempo da música sempre pode ser belo, mesmo que dissonante. As mudanças no tempo em nossa vida tende a ser mais sofrido. Então buscamos saber qual é o novo tom a seguir, qual é o compasso, e os dedos parecem não acompanhar.
Saí num ônibus de Curitiba rumo a Rondônia para um encontro em meio a Amazônia. Lá começava uma viagem de 5 meses ao lado de dois amigos músicos. Nosso ritmo de vida, passada, relacionamento, respiração mudou completamente. Ali, só ali, foi uma vida inteira. E tínhamos também o lindo dançar da música e dos sons. E assim sempre estávamos rodeados pelos mais incríveis personagens, músicos, artistas, queridos. Neste novo movimento, fomos parar em um palco em La Serena, ficamos amigos dos grandes músicos do grupo Cantaro, dormimos na sala de ensaio de uma banda de reggae. E mesmo não sendo músico, tantos outros encontros a música me presenteou.
CAPAS
O que realmente nos proteje? Ou temos somente uma falsa sensação de controle. Quais roupas realmente ficam bem, quais pessoas nos fazem bem, quais lugares são os ideais para nós, qual é o tênis ideal para minha passada, qual o melhor céu para fotografar.
Estava ao lado de uma estrada, no acostamento. Há horas esperava por alguém seguido na mesma direção e tivesse a coragem e a vontade de ter minha companhia. Não escolhia. Todos eram ideais para mim. Comia o saco de bolacha que tinha na mochila. Era tudo que precisava. E quando ninguém parou, fiquei feliz em deitar num gramado ali perto, entre árvores, um saco de dormir e todas as roupas no corpo, para não passar frio. A Lua era meu relógio e não precisava de outra coisa para sentir o tempo passar.
OVO
Todo o universo num único ovo. O renascimento em seu sentido mais puro, o recomeço e as infinitas possibilidades do crescimentos, da morte, do ciclo. Tento alcançar este ensinamento.
A ressureição, não temos como fugir. Para nós o outono começou há pouco, para outros a primavera. As folhas caem, as flores nascem.
E os desafios fazem o carinho que sinto aumentar. A dor, sim, pode trazer o amor. E quando vejo o sangue que escorre no chão de minha perna, ao lado de pessoa especial, só vejo beleza. A distância nos une e o momento, como a vida, é este rio.
Imagino a terra com uma luz dourada.
Verde
Do limoeiro de casa colhi o meu colar.
Ver-te ó belo verde.
Que tão és eterno em amor.
Nos cede tanto mesmo em meio ao ódio e à cobiça.
Imenso emaranhado de vida.
Sementes verdadeiras de esperança
A criação diária.
A reprodução do impermanente.
Então convida-me para esta dança
Que vou…
Ah vou, de corpo e alma entrego-te o pouco de mim
E rego-me com suas lágrimas
Vermelho
Olhar amoroso, olhar ardente, olhar com cobiça, olhar com desprezo, olhar de esguelha, olhar por cima dos ombros, olhar de relance, olhar espantado, olhar para o céu. Olhe!
Dos 5 sentidos, nenhum é tão valorizado por nós como a visão. Mas podemos ver, observar profundamente, ou somente entrever. E como ver melhor, e saber de cor tudo aquilo que importa? O corpo memoriza o que mais repetimos no nosso dia a dia, aquelas coisas que sempre voltam, que são presença constante, e assim consideradas importantes no nosso hard drive limitado. Nosso inconsciente também trabalha de forma direta com nossos pensamentos. Desta forma, é vital pensar somente o que queremos para nós e para o próximo. Assim quando as boas oportunidades aparecerem, as belezas passarem em nossa frente, estaremos prontos para notar, considerar e agir positivamente.
Vemos tudo de forma diferente dependendo de como estamos, felizes ou tristes, empolgados ou depressivos. As cores são outras, os contornos as vezes não tão claros, o foco desprovido de clareza. Agradeça se você tem todos os sentidos, pois nada como experimentar o mundo de forma diversa e complementar.
Mas não posso negar o quanto trocar um olhar é uma conexão grandiosa. Ver o outro. Realmente ver o outro. Mesmo sem tocar.
Não julgue pela aparência. Medite e, assim, sinta sem conceitos. E por que não, de vez em quando, olhar como uma criança, aberto a aprender, absorver, envolver com a alma.
Branco
E então saio da tormenta, do mar bravo, das eternas ondas e barulhos dos estais. Chego àquele gramado sonhado e sento sob aquela bela árvore. E o que sinto…
Afinal, qual é o resultado da soma de todas as cores, e de todos os sons. Qual é a soma de tudo que conhecemos e não conhecemos no universo. E sentado sob a arvore pergunto a mim mesmo: qual é o resultado da soma de todos os sentimentos? E gosto de pensar que é a paz.
E na paz, sem culpa pelo ócio, e sabendo de sua importância, sem apego demais à alegria do momento ou à tristeza vivida, consigo observar como nunca o movimento das folhas, milhares delas, inclusive àquelas que se desprendem e voam. Sinto a impermanência que me rodeia, e ao perceber sua beleza, nada mais falta, tudo é abundante, infinito e, mesmo que contraditório, eterno de certa forma.
Amarelo
Na solitude, amar o elo.
Sinônimos da palavra elo: conexão, junção, ligação, relação, união, vinculação
Significados:
1. argola de corrente.
2. relação existente entre pessoas ou coisas; conexão, vinculação, união.
Lembro de estar por 15 dias no meio do oceano Atlântico, em travessia que durou 27 dias. Tudo parecia muito distante. Foi quase um quarentena, com uma família que acabara de conhecer: fora meu grande amigo Thomas. É incrível como tudo nos faz lembrar da terra firme e imaginar um grande gramado trás uma vontade tão grande. Nada deve ser mais lindo do que deitar sob a copa de uma grande árvore. E as ondas parecem montanhas com um pouco de imaginação.
O que me chama a atenção é que em nenhum momento como este amei mais a possibilidade de deitar sob uma árvore, de estar numa mesa rodeada de amigos, de deslizar numa bicicleta, de caminhar para qualquer lado. Nunca amei tanto estas coisas e possibilidades. E amar é muito bom.
Lembro de termos tido a oportunidade de usar um telefone via satélite para ligar para uma amiga no Brasil e dar os parabéns pelo seu aniversário. Foi um dos parabéns mais especiais que já dei.
As dificuldades trazem experiências que podem ficar positivamente gravadas na memória, fazer amizades criarem proporções novas, pensamentos se aprofundarem no inconsciente.
Após o frio da noite encostado numa pedra, os raios de Sol tem uma cor diferente.
A noite sempre me causou espanto e atração, como um ser na floresta. Considero-me um ser do dia, mas vejo uma beleza sem fim no momento que o sol vai deixando rastros de sangue no céu e me vejo na ânsia de eternidade de um momento tão passageiro. E então não vejo mais a minha volta e me questiono quem me rodeia. Questiono a solidão. Penso nos diversos seres e estico o braço para sentir a quem alcanço. Ninguém está lá. Mas está. E sinto o cheiro e ouço os pequenos sons, o vento, os insetos buscando abrigo. Os animais da noite rastejam, voam, caminham com cuidado. As estrelas já brilham no céu e conto o tempo com sua dança circular. São então minha companhia e o tempo passar devagar, suave e denso. Mas isso é possível? O fogo trepida e o cheiro tem calor então. A luz de sangue volta de empréstimo, enquanto a lenha durar, enquanto o sono não levar minha consciência para outro espaço, para outra dimensão.
















































